Trechos da sabatina do procurador e conselheiro Antonio Duarte no Senado

No último dia 10, o nome do procurador de Justiça Militar Antonio Pereira Duarte foi aprovado pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado Federal para um segundo mandato, biênio (2015/2017), como membro do Conselho Nacional do Ministério Público – CNMP. O procurador, indicado pelo Ministério Público Militar, foi sabatinado pelo colegiado e, em seguida, sua indicação foi aprovada na CCJ, por 16 votos a favor e 1 contra. A indicação segue agora com urgência para votação pelo Plenário do Senado.

Durante a sabatina, Antonio Duarte foi questionado sobre diversos temas afetos ao Ministério Público Militar e à Justiça Militar: a manutenção da Justiça Militar; o controle externo da atividade policial judiciária militar; o aumento da competência da Justiça Militar da União; a presença da Justiça Militar na composição do Conselho Nacional de Justiça – CNJ; o sistema prisional brasileiro; entre outros.

Leia abaixo trechos da sabatina do procurador e conselheiro Antonio Pereira Duarte:

Pergunta do senador Antonio Anastasia (PSDB/MG), relator, sobre o papel do Ministério Público neste esforço em prol da melhoria da execução penal no país.

Antonio Duarte – “Sua indagação é de alta relevância, sobretudo agora que se discute, neste contexto, a própria federalização da segurança pública.
Nós que integramos a Comissão do Sistema Prisional, Controle Externo e Segurança Pública do CNMP temos percebido a importância, cada vez maior, de um olhar sensível do Congresso Nacional e também do Executivo em direção às questões que nos afligem.

O modelo do sistema penitenciário precisa, com toda certeza, desse olhar atento, dessa preocupação. Então, justamente por conta disso, o CNMP, não ficando no muro, mas buscando uma posição proativa, uniu esforços com diversas instâncias – Ministério da Justiça, secretarias, etc e tal – para poder alavancar medidas de médio, curto e longo prazo em relação ao programa Segurança Sem Violência – eu disponho dele aqui e posso, inclusive repassá-lo aos Senadores que tiverem interesse em conhecê-lo –, mas buscando ali, sobretudo, Senador… Agora mesmo, neste horário, está sendo lançado, no âmbito do CNMP, um programa chamado Identidade Cidadã, que tenta, de alguma forma, estimular que os egressos do sistema prisional possam ter oportunidade não só de restaurar a sua condição cidadã, mas também de serem reinseridos de forma condigna com documentação hábil para que eles possam também disputar uma colocação no mercado de trabalho.

V. Exª comentou a bem sucedida trajetória das APACs, que, embora fossem de iniciativa privada, em parceria com o lado público, terminaram sendo um avanço considerável para mostrar que, quando há boa vontade, é possível construirmos soluções.

Nesse sentido, o CNMP alinha-se com todos esses esforços, inclusive com essa vitoriosa atuação do Estado de Minas, no sentido de fomentar, de criar.
Eu digo isto a V. Exª porque o CNMP, também percorrendo diversos Estados do Brasil, especialmente nas inspeções da Corregedoria Nacional, tem estimulado esse modelo, como tem feito no Espírito Santo e em outros Estados do Brasil.

Eu penso que é um problema macro, um problema que não se soluciona com um passe de mágica, mas, havendo toda essa disposição, essa vontade política, esse interesse, esse olhar atento do Congresso Nacional, do Executivo e de todas as outras instâncias, eu penso que nós vamos caminhar bem no sentido de remodelar o nosso sistema penitenciário e garantir, com isso, que daqui a mais alguns anos nós possamos ter um cenário muito mais adequado, com índices mais adequados em termos de criminalidade, porque, se nós não trabalharmos, se não unirmos esforços às diversas instituições – uma andorinha só não faz verão –, certamente, o caminho será no sentido de melhorar este perfil.

Eu tenho certeza, Senador Anastasia, de que o CNMP, neste sentido, não ficará à margem da história e gerará a ação necessária, a ação protagonista necessária, alinhando esforços com o Congresso e com todas as demais instituições, no sentido de buscar, como tem buscado, melhorar o perfil da nossa segurança pública, do nosso sistema prisional”.

Pergunta do senador Senador Álvaro Dias. (PSDB/PR) sobre a pouca visibilidade do Ministério Público Militar e a manutenção da Justiça Militar.

Antonio Duarte – “Senador, o Ministério Público Militar é uma instituição que nasceu nos distantes idos de 1920. Desde então, tem servido à República brasileira da melhor forma possível, tentando, com sua atuação tanto preventiva quanto resolutiva, buscar melhorar, cada vez mais, o perfil de atuação das nossas Forças Armadas, que são as instituições responsáveis pela segurança e estabilidade democráticas, sobretudo porque zelam pela intangibilidade das instituições democráticas.

E nesse sentido, o Ministério Público Militar tem sempre feito o melhor esforço no sentido de encaminhar soluções, de atuar na preservação do patrimônio público militar, da saúde militar. A sua atuação não se restringe única e exclusivamente ao contexto criminal. Na verdade a atuação preventiva vai muito além, porque os membros do Ministério Público Militar – somos em 79 no Brasil inteiro; é uma instituição relativamente enxuta, mas nem por isso desimportante no cenário, na constelação das responsabilidades nacionais –, nós temos percorrido o Brasil inteiro com os membros do Ministério Público Militar, fiscalizando as unidades prisionais militares, fiscalizando a comida que é servida aos militares, porque tudo isso passa por uma série de regras, fiscalizando a saúde que tem sido oferecida aos integrantes das Forças Armadas, enfim, atuando de forma tal que as instituições militares não sofram solução de continuidade nas suas missões, que são intransferíveis e, portanto, inadiáveis.

Assim, parece-me que a nossa preocupação em elevar o perfil do Ministério Público Militar junto aos demais ramos do Ministério Público brasileiro é no sentido de mostrar que nós podemos até atuar muito mais além. E o que às vezes nos falta? Às vezes nos falta o reconhecimento legislativo, porque, muitas vezes, nas iniciativas legislativas desta Casa e da Câmara dos Deputados, o que ocorre é que as instâncias da Justiça Militar e do Ministério Público Militar são esquecidas nos projetos de lei. Só para V. Exª ter uma ideia, em relação à Lei dos Crimes Hediondos, esqueceram-se de estender para os crimes tipificados no Código Penal Militar que têm natureza hedionda também essa natureza, o que não é, no meu modo de pensar, algo que seja muito razoável, até para você não gerar aquilo que pranteado Ministro, já falecido, Jorge Alberto Romero, do STM, dizia que seriam antinomias inconciliáveis entre o Código Penal comum e o Código Penal Militar.

Então, é nesse sentido que talvez nós provoquemos essa reflexão de V. Exªs no sentido de não se olvidarem de que esse ramo especializado é um dos poucos ramos especializados de fato no contexto do Ministério Público brasileiro, mas que tem missões extremamente relevantes, a meu sentir, e eu me sinto honrado de ocupar um dos seus quadros.

V. Exª salientou outro aspecto importante. Eu não considero, honesta e sinceramente, Senador – falo isto com muita franqueza –, que a Justiça Militar brasileira não tenha importância pelo número reduzido dos seus feitos. Eu penso até que o raciocínio deveria ser o contrário: a Justiça comum é que deveria ter o número de feitos da Justiça Militar, porque, no atual estágio, o que nós observamos é um esforço ingente do CNJ no sentido de tentar estabelecer metas para que o Judiciário brasileiro atenda às inumeráveis demandas que só vão aumentando e inchando, inchando o nosso Judiciário. Ou seja, soluções que muitas das vezes, vamos dizer assim, não são por culpa dos magistrados.

E outro aspecto que eu queria ressaltar, Senador Alvaro Dias, a quem agradeço pela indagação, muito oportuna, é para que os Senadores também reflitam sobre alguns aspectos relacionados à Justiça Militar brasileira. Primeiramente, é um órgão do Judiciário que integra o Poder Judiciário nacional. Não é, como, equivocadamente, muitos, às vezes apressadamente, decantam, uma Justiça de exceção. Não é! É uma Justiça, na verdade, especializada, com juízes civis… Há os conselhos julgadores, compostos por militares, mas o juiz togado, o juiz civil é quem conduz todas as sessões. Os promotores são civis, os defensores também.
Então, é uma estrutura enxuta, com poucos magistrados, 42 no Brasil inteiro, responsáveis por atuar em relação a uma clientela que chega a mais de 300 mil jurisdicionados, se nós colocarmos apenas os militares nesse contexto. O civil somente excepcionalmente responde perante a Justiça Militar, em casos como roubo de armamento, quando invadem os quartéis, etc. Não é uma Justiça natural do civil, pois é uma Justiça que alcança os civis apenas excepcionalmente.

Nós temos aí um projeto de emenda constitucional no bojo da reforma do Judiciário, ainda como herança dessa segunda parte da reforma do Judiciário, e seria oportuno que nós pudéssemos trazer a V. Exªs essa preocupação de ampliar a possibilidade de a Justiça Militar brasileira servir melhor ao País, abrindo espaço, por exemplo, para as questões disciplinares. Eu, particularmente falando, defendo que seja em relação a todas questões, administrativas, previdenciárias, cíveis, que envolvam os militares, que é uma estrutura à parte, Senador, e a Constituição, o constituinte originário autorizou, abriu uma porta no art. 142, §3º, inciso X, para dizer que lei própria estabelecerá situações peculiares dos militares, seus deveres, suas obrigações, suas prerrogativas, seus interesses.
Enfim, permitiu que o legislador infraconstitucional estabelecesse, portanto, um arcabouço próprio para esse contexto de servidores que têm, entre os seus compromissos, de forma inapelável, zelas pela defesa da Pátria, até com o compromisso de entregar a vida, se necessário for.

Então, são instâncias que têm que ter um trato diferente, que têm que ter uma Justiça célere e não podem sofrer as mazelas do sistema jurisdicional comum, onde, infelizmente, muitas vezes, um processo leva cinco, seis, dez anos para ser solucionado. Se isso acontecesse na Justiça Militar, eu, certamente, teria tristeza no meu coração, e nós poderíamos começar a ter uma outra visão.

Certa feita, só para concluir em relação à segunda questão, o General comandante da 4ª Região Militar, em Minas Gerais, chegou até meu gabinete e indagou: “E aí, Dr. Duarte, muitos inquéritos, muitos processos?” E eu, rapidamente, falei: “Não, General, de maneira alguma. Se houvesse muitos processos, muitos inquéritos, V. Exª não estaria comandando bem”. Num contexto em que as regras de coesão são disciplina e hierarquia, em que o oficial tem que mostrar constantemente que ostenta dignidade e compatibilidade para com o oficialato – se não, ele é julgado no Tribunal de Honra e pelo Superior Tribunal Militar –, nós não podemos imaginar que as regras sejam desatendidas, até porque, se houver situação de conflito, a coesão é fundamental.

A tropa tem que estar bem direcionada, bem coesa, bem disciplinada e sabendo obedecer às orientações de seu comando.

Então, nesse sentido é que esse ethos é um ethos particular, que exige uma psicologia especial. Eu gosto muito daquela expressão que diz que o militar, quando veste a sua farda, não o faz com indiferença, e, muitas vezes, a utiliza como se fosse um manto que adere à alma irreversivelmente para sempre.
Eu defendo muito essa linha, essa postura, porque é assim que o Brasil precisa ser construído, com homens públicos, com essa mesma linha, com esse mesmo pensamento de trabalhar em prol da elevação dos índices sociais do nosso País
”.

Pergunta do senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB/SP) sobre a especificidade da Justiça Militar e a ausência da Justiça Militar no CNJ.

Antonio Duarte – “Existe hoje um projeto, sob a competente relatoria do Senador Anastasia, estabelecendo que o CNJ discuta as questões que atingem todos os ramos da Justiça brasileira, todos os órgãos, inclusive a Justiça Militar. Eu acho que isso até quebraria um pouco o espírito da uniformidade decisória, já que um dos seus braços, a Justiça Militar, que integra o Poder Judiciário Nacional, é a mais antiga instituição – eu diria que é a mãe de todas as outras, porque ela veio com D. João VI, na sua comitiva, e foi a primeira que se instalou no Brasil, nos distantes idos de 1808. No entanto, apesar de ser mais do que bicentenária, ela foi esquecida na composição do CNJ.

A competente Ministra Maria Elizabeth, que presidiu recentemente a Superior Corte Castrense, alavancou esse projeto no sentido de fazer com que o Congresso reflita sobre essa ausência, o que me parece não fazer com que as decisões do CNJ tenham legitimidade, pelo menos em relação à Justiça Militar”.

Senador Aloysio Nunes Ferreira – “Na época em que foi aprovada a Emenda à Constituição que criou o Conselho Nacional de Justiça, havia uma controvérsia sobre a existência da Justiça Militar, que hoje está absolutamente superada. É por isso que a proposta de emenda à Constituição, cujo primeiro subscritor é o Senador Anastasia, tem toda a pertinência e deveria realmente ser aprovada agora, porque não há mais nenhuma dúvida quanto à necessidade de termos uma Justiça Militar funcionando no nosso País”.

Antonio Duarte – “Eu reforço o argumento de que sua existência especializada motiva ou deveria motivar um aproveitamento maior da sua capacidade de atuação, ampliando-se, portanto, para as questões administrativas, previdenciárias, cíveis e militares.
Penso que mandar essas questões, essas demandas para a jurisdição comum só faz inchar ainda mais aqueles órgãos e não aproveita esse espaço que a Justiça Militar brasileira deve ter para poder contribuir, como acontece com as Justiças Militares estaduais, que tiveram ampliada a sua competência em relação ao controle das punições disciplinares
”.

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