PJM Fortaleza – ações penais apuram fraudes licitatórias no 2º BEC

Um dos denunciados pela Procuradoria de Justiça Militar em Fortaleza, em ação penal que apura fraudes licitatórias no 2° Batalhão de Engenharia e Construção (2° BEC), não foi localizado para citação. Até então residente em João Pessoa, PB, o civil encontra-se foragido.

Em setembro/2020, a Auditoria da 10ª Circunscrição Judiciária Militar recebeu as quatro denúncias, oferecidas em separado pela PJM Fortaleza, relacionadas a fraudes em procedimentos licitatórios instaurados no 2° BEC do Exército, em Teresina/PI.

As investigações foram iniciadas com a deflagração da “Operação Amalteia”, pela Polícia Federal, que tinha por objeto a apuração de práticas de irregularidades envolvendo o desvio de recursos públicos do Programa Leite da Paraíba, com a utilização de empresas de “fachada”, para fins de participação em licitações fraudulentas em órgãos públicos federais. Com o avanço das investigações, foi observado que as irregularidades praticadas abrangiam licitações realizadas pelo 2° BEC.

Dados obtidos em decorrência das quebras de sigilo telefônico e fiscal, autorizadas judicialmente, revelaram a existência de uma organização criminosa denominada CLIFF, integrada por um ex-tenente, então pregoeiro do 2º BEC; um empresário; e dois civis, laranjas no esquema. Todos são réus em uma das ações penais instauradas em decorrência das fraudes no Batalhão. Essas interceptações também indicaram a suposta prática de irregularidades envolvendo o pregoeiro do 2º BEC e outras pessoas beneficiadas pelo militar em procedimentos licitatórios ali realizados. Tais irregularidades geraram as demais denúncias e, com o acolhimento, outras três ações penais em trâmite na 10ª CJM.

Conforme apurado pelo MPM, a Organização Criminosa CLIFF estava estabelecida em três núcleos: o empresarial; a célula dos laranjas e colaboradores; e o núcleo do serviço público. O primeiro núcleo era composto pelo empresário denunciado, cabeça da organização; o segundo, pelos dois civis envolvidos; por fim, o ex-tenente era o responsável pela articulação no serviço público. A execução das tarefas ocorria de maneira estruturada e dividida entre os membros do grupo.

As fraudes nas licitações ocorriam das mais variadas formas: participação de empresas do mesmo grupo que concorriam entre si, simulando uma disputa que na verdade não existia; empresa licitante com sócio em comum com outra empresa licitante; exclusão injustificada de participantes; admissão de participantes que não apresentavam os requisitos de qualificação; presença de poucos participantes em contratos economicamente interessantes; cláusulas restritivas da concorrência que estabeleciam características especiais, ou estabeleciam condições difíceis de atender, ou que oneravam demasiadamente os competidores, ou impunham contatos pessoais; e presença de empresas de fachada.

A prática criminosa foi monitorada durante todo ano de 2012 e continuou em 2013, com vultosos valores envolvidos nas licitações fraudadas, gerando grande prejuízo aos cofres públicos e enorme beneficiamento dos criminosos.

Foi verificado que os civis denunciados, os laranjas, respondiam formalmente por uma série de empresas que de fato pertenciam ao empresário, utilizadas para simulação das concorrências promovidas pelo 2º BEC. Já o ex-tenente, aproveitando-se das prerrogativas inerentes à função de pregoeiro oficial do 2° BEC, direcionava licitações em benefício de empresas de sua escolha, prestando-lhes informações sigilosas sobre propostas, antecipando-lhes detalhes de certames licitatórios que ainda nem haviam sido iniciados, desclassificando concorrentes e, dessa forma, frustrando o caráter competitivo das licitações.

Uma pessoa com papel fundamental nessa organização era uma contadora que prestava serviços para diversas empresas utilizadas no esquema. Ela era responsável pela emissão de guias de declaração. Sua atuação comprova que os denunciados atuavam em perfeita subsunção da norma de integração de verdadeira Organização Criminosa. Com o seu falecimento durante o curso das investigações, o MPM pediu a extinção de sua punibilidade.

Para o MPM, os delitos perpetrados pelos investigados do Núcleo foram praticados em permanência delitiva, configurando o previsto no art. 2º da Lei de Organização Criminosa (Lei n.12.850/2013): promover, constituir, financiar ou integrar, pessoalmente organização criminosa.

Também estão evidentes os delitos de corrupção passiva e ativa descritos nos artigos 308 e 309 do Código Penal Militar. Evidenciados, entre outros, em interceptação telefônica, quando o ex-tenente informa sobre uma viagem a serviço e solicita o auxílio para o pagamento das aludidas vantagens.

A quebra de sigilo fiscal revelou ainda que, no ano de 2013, o ex-tenente movimentou em suas contas R$ 9.121,00 a mais que os rendimentos declarados. Também a conta bancária de sua esposa foi utilizada para transações financeiras, com créditos bancários não justificados, superiores a R$ 60 mil.

Nessa ação penal principal relacionada ao grupo intitulado CLIFF, o ex-tenente responde, na Justiça Militar da União, pelos crimes previstos no art. 53, parágrafo segundo, do Código Penal Militar (CPM), já que organizou, promoveu e dirigiu a prática criminosa; no art. 2º, caput, da Lei n. 12.850/2013, ao integrar organização criminosa; e no art. 308 do CPM, corrupção passiva, por receber vantagem indevida em razão do cargo que ocupava.

Os outros envolvidos, o empresário e os dois civis, respondem pela autoria dos seguintes crimes: art. 2º, caput, da Lei n. 12.850/2013, “Promover, constituir, financiar ou integrar, pessoalmente ou por interposta pessoa, organização criminosa”; e art. 309 do CPM, corrupção ativa. Ao empresário, cabeça da organização, também foi atribuído o crime tipificado no art. 53, do CPM, já que organizou e promoveu o crime.

As outras três denúncias, também recebidas pela 10ª CJM, relacionam o ex-tenente e partícipes em outras fraudes licitatórias, porém, sem que eles apareçam vinculados a essa organização criminosa identificada como CLIFF. O modo de agir dos envolvidos revela bastante semelhança com as fraudes percebidas no processo principal. Entre esses novos atores: a esposa do pregoeiro, que participou das empreitadas em coautoria com o marido; um tenente do Exército; e dois empresários proprietários de empresas com pregões homologados no 2º BEC. Os crimes em que incorreram são os mesmos já detalhados na primeira denúncia.

Quando do recebimento da denúncia, o juiz federal substituto da Justiça Militar estabeleceu que os reparos pelos prejuízos causados ao erário, citados pelo MPM, serão objeto de análise apenas na existência de uma condenação futura. A PJM Fortaleza havia requerido a fixação de quantia mínima para reparação dos danos causados pelas infrações, a ser dividida solidariamente entre os réus, e calculada em R$ 540 mil, em valores não atualizados. Requereu ainda, caso ocorra a condenação, a perda de R$ 71.875,22, em valores não atualizados, referente ao montante identificado nas contas bancárias do ex-tenente e de sua esposa, não auferido por intermédio de fonte pagadora lícita.