PJM Rio de Janeiro requer condenação de militares e civis envolvidos em licitações irregulares do IME/DNIT

A 2ª Procuradoria de Justiça Militar no Rio de Janeiro apresentou alegações finais requerendo a condenação de cinco militares (dois coronéis, um major, um tenente-coronel e um capitão) e quatro civis pela prática do crime de peculato-desvio, previsto no art. 303 do Código Penal Militar. Entre 2004 e 2005, os envolvidos realizaram 88 procedimentos licitatórios fraudulentos, em convênios firmados entre o Instituto Militar de Engenharia (IME) e o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte (DNIT). O montante desviado soma aproximadamente R$ 11 milhões, valores da época.

A empreitada criminosa tinha uma característica de continuidade delitiva, com atos semelhantes, repetitivos e sistemáticos, envolvendo os mesmos agentes administrativos e civis. As práticas irregularidades eram diversas: contratação de empresas de fachada e sem capacidade técnica em engenharia de transportes; emissão de declarações e atestes de serviços não prestados; emissão de notas fiscais falsas; pagamentos indevidos, mediante aditivos e valores acima do adjudicado, sem nenhuma justificativa, assim como por serviços não realizados.

O Ministério Público Militar apurou que foi montada uma verdadeira engenharia criminosa, com a formação de três grupos com atividades ilícitas bem definidas, sendo que todos os seus integrantes atuavam de forma articulada: o primeiro grupo era formado pelos integrantes da coordenação dos convênios DNIT/IME, sendo um dos coronéis denunciados o coordenador-geral (técnico), e o major, o coordenador administrativo; o segundo, composto pelos civis, empresários e um contabilista; e, o terceiro grupo, era composto por integrantes da Administração do IME, o outro coronel, há época ordenador de despesa e depois tesoureiro, o tenente-coronel, tesoureiro e depois presidente de Comissão de Licitação e almoxarife, e o capitão, almoxarife e integrante da Comissão Permanente de Licitações.

Perícia realizada pelo Centro de Apoio à Investigação – CPADSI do MPM constatou inúmeras irregularidades nos procedimentos licitatórios, modalidade convite, realizados pelo IME no período: fracionamento de licitação com fuga da modalidade apropriada; valores adjudicados superiores aos estimados; valores pagos acima dos valores adjudicados; pagamentos realizados à empresa diferente da vencedora do certame; participação de empresas com mesmo quadro societário; falta de pesquisa de mercado para formação da estimativa de preços e escolha da modalidade; apresentação de propostas com objetos distintos daqueles previstos no edital; não observância de prazos entre a entrega dos convites e a realização da reunião para habilitação dos licitantes; vários convites com o mesmo objeto; vários convites realizados no mesmo dia.

No período de setembro de 2004 a dezembro de 2005, foram emitidas 253 declarações ideologicamente falsas, atestando o recebimento de serviços que não foram realizados. Há casos em que sequer a declaração foi produzida.

As empresas que participavam desses certames licitatórios eram sempre as mesmas. De um total de oito empresas, seis foram constituídas pelos dois empresários denunciados, com o assessoramento de um contabilista, em 2004, pouco ou imediatamente antes da grande incidência de licitações realizadas pelo IME. Também foi verificado que essas empresas eram constituídas por pessoas humildes, de baixo nível de escolaridade e com pequena renda familiar. Além disso, entre os sócios dessas empresas há parentes e amigos dos denunciados.

As investigações conduzidas pela PJM Rio de Janeiro constataram ainda uma evolução patrimonial incompatível com a renda que os envolvidos recebiam de suas atividades profissionais.

Tomada de Contas Especial realizada pela Primeira Inspetoria de Contabilidade e Finanças do Exército concluiu que “todos os 88 processos licitatórios foram forjados, nunca houve competitividade entre as empresas, era um jogo de cartas marcadas, assim como foram realizados pagamentos indevidos – mero repasse de recursos às empresas envolvidas no esquema -, culminando em prejuízo ao erário, resultado de uma consistente trama alinhavada e executada por agentes administrativos do IME, dos coordenadores dos convênios IME/DNIT e dos civis sócios das empresas”. Cálculos realizados nessa TCE revelaram que os prejuízos ao erário, pelas fraudes e pagamentos indevidos desses processos licitatórios, superaram o montante de R$ 25 milhões, valores atualizados até dezembro de 2011.
No curso da instrução criminal, também foi realizada Tomada de Contas Especial pelo Tribunal de Contas da União, pelo qual constatou-se a fraude generalizada na realização dos procedimentos licitatórios relativos aos convênios DNIT/IME, no período de 2004/2005, o conluio dos coordenadores dos convênios DNIT/IME com os agentes administrativos do IME e os civis empresários e contabilista, assim como a inexecução dos serviços por parte das empresas de fachada e os prejuízos causados ao erário.

Por ocasião de seus interrogatórios no Conselho Especial de Justiça, todos os acusados negaram ter participado da empreitada criminosa, no entanto admitiram muitos fatos narrados na denúncia, assim como imputaram a autoria de certos fatos a outros corréus.
O Inquérito Policial Militar para apurar eventuais fraudes em licitações e contratos ocorridos no âmbito do IME, nos anos de 2004 e 2005, foi instaurado em 13 de maio de 2010, por portaria do general de Exército Augusto Heleno Ribeiro Pereira, então chefe do Departamento de Ciência e Tecnologia, em razão de denúncias divulgadas pela imprensa. O referido IPM também foi instruído com os autos do Procedimento de Investigação Criminal (PIC), nº 0000177-21.2009.1105, instaurado em 18 de dezembro de 2009, na 5ª Procuradoria de Justiça Militar no Rio de Janeiro, após o recebimento de e-mails relatando irregularidades em processos licitatórios e contratos realizados no IME, nos anos de 2004 e 2005, referentes aos convênios celebrados com o DNIT.

Com todas essas evidências, a 2ª Procuradoria de Justiça Militar no Rio de Janeiro requer a condenação do coronel R1, coordenador-geral, do major, coordenador adminstrativo, dos dois empresários civis, do coronel e do tenente-coronel como incursos no artigo 303, caput e §1º (peculato-desvio), do Código Penal Militar, por 236 vezes. Para o capitão e os outros dois civis, o MPM requer a condenação pela prática do mesmo crime, contudo, o número de ocorrências foi menor, 182 vezes, 17 vezes e 41 vezes, respectivamente.

O MPM requer ainda que seja mantido o sequestro e o arresto dos imóveis dos envolvidos até o trânsito em julgado de eventual sentença condenatória, para fins de ressarcimento ao erário.

No pedido, é requerida ainda a absolvição de quatro civis que figuraram como “laranjas”, por não ter sido possível comprovar a efetiva participação deles no esquema fraudulento. Assim como a extinção de punibilidade de outro civil, falecido no curso do processo. O Superior Tribunal Militar determinou também a exclusão de um oficial do processo.

Continuidade – Ressalte-se que essa empreitada criminosa não teve fim com a conclusão das licitações e da suposta execução dos serviços relativos aos convênios DNIT/IME.

Em 2005, o então Secretário de Ciência e Tecnologia, tentou acabar com estes convênios, quando constatadas irregularidades na execução e aplicação dos recursos desses convênios, notadamente pelo repasse indevido de R$ 6 milhões pelo IME à Fundação Ricardo Franco, com dispensa de licitação, em dezembro de 2004. Recursos a serem supostamente empregados no ano subsequente, fato ratificado por uma Auditoria da 1ª ICFEx.

Em razão disso, a partir de 2006, houve um novo acordo entre o Exército e o Ministério dos Transportes, mediante uma parceria entre o Departamento de Engenharia e Construção (DEC) e o DNIT. Assim, a coordenação dos convênios DNIT/IME passou a atuar na parceria DNIT/DEC, criando-se o Centro de Excelência em Transportes (CENTRAN), cujos coordenadores eram o coronel e do major denunciados.

Enfim, os dois oficiais continuaram nesse encargo no período de março de 2006 a abril de 2009, quando foram apenas afastados após sumária sindicância realizada no DEC, em razão de denúncias semelhantes às que deram origem à presente ação penal militar. Tais fatos estão sendo apurados em procedimento investigativo no âmbito do MPM (Procedimento Investigatório Criminal nº 0000039-63.2010.1105, instaurado em 31/08/2010 na 5ªPJM/RJ) e por meio de um Inquérito Policial Militar instaurado pela Chefia do Departamento de Engenharia e Construção.