
Denúncia oferecida pela Procuradoria de Justiça Militar no Recife é acolhida e 2º sargento do Exército é condenado a 13 anos e 4 meses de reclusão por estupro de vulnerável.
Na decisão, o Conselho Permanente de Justiça (CPJ) da Auditoria da 7ª Circunscrição Judiciária Militar, no Recife (7ª CJM/PE), por unanimidade, condenou o militar como incurso no crime previsto no art. 232, § 3º do Código Penal Militar (CPM), considerando a alteração legislativa promovida pela Lei nº 14.688/2023, que, entre outras modificações, assimilou as realizadas no Código Penal (CP) pela Lei nº 12.015/2009, relativas aos crimes contra a dignidade sexual. Tal alteração “reflete um reconhecimento tardio da necessidade de adequação da legislação penal militar aos parâmetros internacionais de proteção dos direitos humanos das mulheres”, declarou o juízo da 7ª CJM/PE.
Apesar de o fato ter ocorrido antes da entrada em vigor da Lei nº 14.688/2023, a sentença seguiu o entendimento do Ministério Público Militar, que na denúncia havia requerido a condenação do réu com base no art. 217-A, § 2º do CP, de que o crime de estupro previsto no art. 232 do CPM não seria aplicável à época, em razão da revogação tácita, da inconvencionalidade e da inconstitucionalidade da previsão de uma pena menor para o crime militar de estupro em comparação com o crime comum de estupro, ou seja, a partir da entrada em vigor da Lei nº 12.015/2009.
A primeira tese foi fundamentada na compreensão de que a Lei nº 12.015/2009, ao alterar o CP, revogou tacitamente o crime de estupro previsto no art. 232 do CPM, em razão de ser lei posterior e específica, tendo em vista que dispõe de modo integral sobre os crimes contra a dignidade sexual, o que prevalece sobre a especialidade do CPM, sendo incompatível a manutenção de um apenamento por crime militar de estupro menor que por crime comum de estupro.
A segunda tese foi fundamentada nas Convenções e Tratados dos quais o Brasil é signatário, que exigem punição com efetividade dos que cometem crimes contra as mulheres, em especial a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (Decreto nº 1.973, de 1996), também conhecida como Convenção de Belém do Pará, e a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (Decreto nº 4.377, de 2002).
A terceira tese foi fundamentada, em especial, na violação ao princípio da proporcionalidade, da razoabilidade e da igualdade, que impedem que um crime militar de estupro tenha pena inferior ao crime comum de estupro.
Ao final, tendo em vista a compatibilização do CPM a partir da Lei nº 14.688/2023, a condenação ocorreu no crime previsto no art. 232, § 3º do CPM, em razão de ter ocorrido a continuidade normativo típica, promovendo resposta penal condizente com a gravidade dessa violação de direitos humanos.
O princípio da continuidade normativo-típica ocorre quando uma nova lei penal revoga expressamente um tipo penal anterior, mas mantém a criminalização da conduta, ainda que sob nova redação, nomenclatura ou sistematização normativa.
Os fatos que originaram a ação ocorreram durante confraternização em unidade militar no Recife, quando sargento com sintomas de embriaguez, mesmo estando de serviço, forçou relação sexual sem o consentimento da vítima, aproveitando de sua situação de vulnerabilidade.
Além da pena de 13 anos e 4 meses de reclusão pelo crime de estupro de vulnerável, previsto no art. 232, § 3º, do CPM, foi imposta pena acessória de exclusão das Forças Armadas, como estabelece o art. 102 do CPM.
Como requerido pelo MPM, foi fixada ainda pelo CPJ da 7ª CJM a reparação pelos danos morais causados à vítima, no valor de R$ 50.000,00.
ADI 7555 (estupro de vulnerável) – A Procuradoria-Geral da República, a partir de representação da Procuradoria-Geral de Justiça Militar, ajuizou a Ação Direta de Inconstitucionalidade 7.555 no Supremo Tribunal Federal, apontando omissão alegadamente inconstitucional da Lei 14.688/2023, consistente na ausência de previsão para o tipo penal militar de estupro de vulnerável, da qualificadora pelo resultado lesão grave ou gravíssima.
Na inicial, são apontados como violados “o art. 1º, III (princípio da dignidade humana); o art. 24, XIV (especial proteção da pessoa com deficiência); art. 227, caput (proteção especial da criança e do adolescente); e 227, § 4º (mandamento constitucional de punição severa do abuso, da violência e da exploração sexual de criança e adolescente)”.
A omissão, como ressaltado pelo MPM na representação, resultou em grave distorção: enquanto o crime comum de estupro de vulnerável com resultado lesão corporal grave é apenado com reclusão de 10 a 20 anos (art. 217-A, § 3º, do CP), o crime militar de estupro de vulnerável com esse mesmo resultado acabaria sendo punido com a pena prevista no § 1º do art. 232 do CPM, que qualifica o estupro previsto no caput e fixa reprimenda substancialmente inferior, de 8 a 12 anos de reclusão.
A ADI ainda não foi julgada pelo STF.
Veja a Representação para o ajuizamento de ADI do MPM à PGR.






























