PJM Rio de Janeiro – Justiça Militar condena militares denunciados por morte de músico e de catador

Oito militares do Exército, denunciados pela 1ª Procuradoria de Justiça Militar no Rio de Janeiro, foram condenados pela morte de músico e de catador em Guadalupe, em julgamento encerrado nessa madrugada (14), na 1ª Auditoria da 1ª Circunscrição Judiciária Militar. O tenente, que comandava ação, foi condenado a 31 anos e seis meses de prisão, os outros sete militares, que também dispararam contra as vítimas, receberam penas de 28 anos de prisão, todos em regime fechado, por duplo homicídio e tentativa de homicídio contra o sogro do músico. Todos os condenados receberam pena acessória de expulsão das Forças Armadas.

Em 07 de abril de 2019, em área urbana, em Guadalupe, no Rio de Janeiro, os militares efetuaram 82 disparos contra o carro da família do músico, 62 desses tiros acertaram o veículo. Além da vítima fatal e do sogro, estavam no carro a esposa, o filho e uma amiga da família. A outro morto na ação, o catador, foi atingido quando se aproximou do veículo para prestar socorro.

O Ministério Público Militar, em 10 de maio de 2019, ofereceu denúncia contra 12 militares pelos crimes de tentativa de homicídio qualificado pelo fato de terem agido com excesso ao atuarem em legítima defesa do dono de um carro roubado; homicídios qualificados por terem causado a morte de um músico e de um catador de recicláveis; tentativa de homicídio qualificado por terem atentado contra a vida do sogro do músico e omissão de socorro às vítimas feridas.

No julgamento, os membros da PJM Rio de Janeiro que atuam no caso, pediram a absolvição de todos os envolvidos em relação ao primeiro evento descrito na denúncia porque não foi possível comprovar, pelo controle deficiente da munição utilizada, se houve o excesso criminoso por parte dos militares na legítima defesa do proprietário do automóvel roubado que estava sob ameaça de arma de fogo.

Quanto ao segundo momento descrito na denúncia, o MPM pediu absolvição de quatro militares acusados por não haver provas de que tenham disparado contra o automóvel do músico e contra o catador, e portanto, não participaram dos crimes de homicídio qualificado, nas modalidades consumada e tentada.

Também não restou configurado crime de omissão de socorro das vítimas feridas. Foi verificado nos autos que o tenente acusado pediu socorro da Polícia Militar logo após o ocorrido.

Como detalhou o MPM durante o julgamento, os disparos foram feitos em dois momentos distintos naquele 7 de abril de 2019. Por volta das 14h30, um grupo de combate composto pelos militares, sob a chefia do tenente condenado, deslocava-se em uma viatura do 1ºBatalhão de Infantaria Motorizada Escola para os Próprios Nacionais Residenciais (PNR) quando se deparou com um roubo de automóvel no qual o seu proprietário estava sob ameaça de uma pistola. Nesse contexto, os acusados, a fim de repelir a ameaça ao dono do veículo roubado, efetuaram disparos de fuzis, em região urbana, na direção dos autores do roubo, que embarcaram no veículo roubado, um  Honda City branco, e num Ford Ka branco não identificado e empreenderam fuga trafegando pela Estrada do Camboatá.

Ocorre que dois desses disparos de fuzil atingiram outro Ford KA branco, dirigido pelo músico que acessava a Estrada do Camboatá vindo da Travessa Brasil, a cerca de 300 metros do local do roubo. Um desses tiros atingiu o músico e ele começou a perder os sentidos.

No segundo momento descrito pelo MPM, o Ford Ka da família parou mais a frente e os ocupantes do banco de trás, a esposa, o filho e a amiga da família, saíram do carro buscando abrigo e pedindo ajuda. O sogro permaneceu no carro, no banco do carona. Nesse instante, o catador de recicláveis, que se encontrava próximo ao local com seu carrinho, foi socorrer o músico ferido, colocando-se ao lado da porta do motorista.

Os militares embarcados na viatura militar, que prosseguiram na Estrada do Camboatá e já tinham perdido de vista os dois carros conduzidos pelos autores do roubo, encontraram o Ford KA branco do músico parado. Supondo tratar-se dos autores do roubo do Honda City, o tenente e, na sequência, sete dos demais acusados deflagraram 82 disparos contra o veículo Ford KA branco e contra o catador, que ainda tentou correr, mas foi alvejado no braço direito, nas costas e caiu ao solo.

O músico, que permanecia desacordado no banco do motorista, foi atingido, pelas costas e na cabeça e morreu no local. O seu sogro, agachado entre o banco do carona e o painel, durante os disparos, foi ferido com tiros de raspão nas costas e no glúteo direito e saiu correndo do carro para se abrigar assim que os disparos cessaram. O catador morreu 11 dias depois ,em um hospital em consequência dos tiros.

As testemunhas presenciais ouvidas durante o processo confirmaram a dinâmica dos fatos narrados da denúncia. Também os acusados, em seus interrogatórios judiciais, admitiram terem disparado contra os assaltantes do automóvel Honda City branco, contra o automóvel do músico e contra o catador. Contudo, tentaram justificar suas ações dizendo que não houve excesso no primeiro evento e que atiraram no carro do músico no segundo momento porque acreditavam ser o carro no qual estavam os assaltantes, além de estarem sofrendo disparos do catador que portava uma pistola.

Durante o julgamento, o MPM argumentou que os militares não agiram dentro das normas nem dentro dos limites da legalidade. Na decisão o Conselho de Justiça para o Exército da 1ª CJM, por maioria, seguiu o MPM e condenou os oito militares que dispararam por duplo homicídio qualificado e pela tentativa de homicídio qualificado. Crime previsto no art. 205, § 2º, do Código Penal Militar.