PJM Recife denuncia 18 pessoas por fraudes na aquisição de materiais no HMAR

A Procuradoria de Justiça Militar no Recife ofereceu denúncia contra sete militares e onze civis por fraudes em processos licitatórios do Hospital Militar de Área do Recife (HMAR), ocorridos entre novembro e dezembro de 2011. O prejuízo causado à administração militar pelos procedimentos supera R$ 4,5 milhões.

Os denunciados, militares com atuação na administração do Hospital e administradores de empresas que deveriam fornecer materiais para a unidade, incorreram nos seguintes crimes: estelionato, art. 251; corrupção passiva, art. 308; corrupção ativa, art. 309; falsidade ideológica, art.312; e subtração de livro oficial, art. 337, todos do Código Penal Militar. Alguns participantes do esquema também foram incursos no crime descrito no art. 96, inciso III, da Lei n 8666/93, Lei de Licitações: fraudar, em prejuízo da Fazenda Pública, licitação instaurada para aquisição ou venda de bens ou mercadorias, ou contrato dela decorrente, entregando uma mercadoria por outra.

Como apurado pelo Ministério Público Militar, o esquema criminoso consistia na simulação de despesas, mediante a emissão de inúmeras notas de empenho, destinadas à aquisição de material, acompanhadas do respectivo pagamento sem que houvesse a efetiva entrega dos bens comprados, resultando em vantagem pecuniária indevida para todos os envolvidos.

Aproveitando da existência de recursos orçamentários para o HMAR no final de 2011, os militares denunciados elaboraram 47 partes requisitórias para compra de materiais de consumo. O objetivo dessas supostas aquisições era justificar a emissão de notas de empenho frias assinadas pelo coronel, então diretor do HMAR e ordenador de despesas, e pelo major, chefe da Seção de Aquisições, Licitações e Contratos.

O dolo ficou evidente por alguns vícios identificados pela PJM Recife nos processos, entre os quais:
– a tenente denunciada, então chefe do Almoxarifado, usurpou atribuições do chefe da Farmácia quando requisitou medicamentos e destes atestou o recebimento, sem estar apta a isso. Outra falha dela foi solicitar material de informática, sem que qualquer setor do HMAR tivesse reportado necessidade.
– os denunciados emitiram notas de empenho antes mesmo da confecção das partes requisitórias, ou seja, foi autorizado o pagamento antes que as áreas interessadas manifestassem a necessidade dos bens e materiais supostamente adquiridos;
– bens adquiridos em quantidades superiores à demanda do HMAR;
– diversos medicamentos requisitados não possuíam histórico de uso no HMAR ou sequer faziam parte dos medicamentos padronizados pelo Hospital.

A 7ª Inspetoria de Contabilidade e Finanças do Exército (ICFEX), em auditoria realizada no HMAR, chegou a recomendar ao então diretor que todo item adquirido fosse registrado no Sistema de Controle Físico do Exército (SISCOFIS), com Ficha de Estoque codificada e nomenclatura correta. Além disso, deveria constar nessa ficha os movimentos de entrada e saída dos itens. Nada disso foi feito pelo coronel, que, por sua vez, autorizou os pagamentos das notas de empenho frias.

Com o intuito de justificar aquisição fictícia de bens que jamais foram entregues ao HMAR, os denunciados inseriram declarações falsas em documentos públicos. A finalidade perseguida consistia em simular a compra de materiais na tentativa de desviar dinheiro público em prejuízo do erário, tanto em benefício dos civis, por intermédio das empresas; como dos militares, na medida em que eram recompensados com dinheiro.

A parte dos civis na fraude era emitir notas fiscais falsas com o objetivo de similar entregas ao HMAR de medicamentos e de materiais de informática jamais fornecidos. Nas investigações, não foram verificadas quaisquer referências à entrada dos materiais descritos nas notas fiscais falsamente atestadas, seja em Boletim Administrativo, seja no SISCOFIS do HMAR.
Somente em 16 de abril de 2012, quatro dias após a PJM Recife encaminhar ofício ao HMAR requisitando informações sobre os procedimentos, foram incluídas notas fiscais e notas de empenho frias para simular a entrada das aquisições liquidadas e pagas.

Ainda com a intenção de apagar os rastros das condutas delituosas, os denunciados confeccionaram documentos falsos solicitando apoio de estoque à empresa de medicamento. Já as empresas, emitiram cartas de crédito para justificar a não entrega dos materiais. Outra iniciativa para tentar encobrir a fraude foi a confecção de Boletim Interno, no qual atestaram que o material referido nas notas fiscais fora entregue.

Contudo, como avalia o MPM, faltou coordenação nessas tentativas de mascarar os crimes, pois, ao mesmo tempo que atestaram o recebimento dos materiais, emitiram documentos alegando que não havia espaço para estocá-los no hospital, culminando com a sugestão de que ficassem guardados na empresa fornecedora de medicamentos.

Contagem física realizada no estoque, em abril de 2012, atestou que uma ínfima parte do material comprado a partir dos empenhos falsos encontrava-se no almoxarifado. Das 9.511 unidades de material de informática adquiridas, apenas 1.351 foram identificadas. Em relação aos medicamentos, dos 39.356 descritos nas notas fiscais atestadas, apenas 8.263 foram localizados no almoxarifado, o que também revela outro procedimento incorreto, já que deveriam estar na Farmácia da unidade.

O general que posteriormente exerceu a função de diretor do HMAR afirmou, em depoimento como testemunha, que a quantidade e a qualidade dos materiais farmacêuticos empenhados nos procedimentos investigados fugiam à sistemática de aquisição do hospital. Eram medicamentos de custo elevado, de uso individualizado, que deveriam ser submetidos a processo próprio. Outro ponto de destaque, é que, nesses casos, a nota de empenho é emitida em nome do paciente. Em relação aos materiais de informática, afirmou que não há justificativa para as aquisições nas quantidades empenhadas, pois estão muito além do histórico de consumo da unidade.

Análises de quebras de sigilo bancário geradas pelo sistema Argus do Centro de Apoio à Investigação (CPADSI) revelaram depósitos efetuados pelas empresas e empresários beneficiados pelo esquema na conta da tenente denunciada, entre fevereiro de 2011 e abril de 2012. Também foram verificados depósitos não identificados nas contas de outros denunciados.

De acordo com o MPM, nas imputações dos crimes cometidos por cada um dos denunciados, somente a tenente chefe do Almoxarifado incidiu 166 vezes no crime de estelionato (art. 251), quatro vezes em falsidade ideológica, cinco vezes em corrupção passiva (art. 308) e três vezes em subtração ou inutilização de livro, processo ou documento (art. 337), todos do Código Penal Militar. Ainda segundo o procurador que assina a denúncia, por 23 vezes ela fraudou licitação ao receber mercadoria diversa da adquirida em licitação. Os outros militares denunciados também cometeram crimes similares repetidas vezes, assim como os civis envolvidos no esquema fraudulento.

A denúncia foi recebida pela Auditoria da 7ª Circunscrição Judiciária Militar que agendou, para o dia 25 de junho de 2018, a oitiva das testemunhas.

Condenações anteriores – Dois dos denunciados, a tenente, chefe do Almoxarifado, e um civil, empresário de uma das empresas fornecedoras de medicamentos, já haviam sido condenados, em agosto de 2017, após denúncia também formulada pela PJM Recife, em outro processo que apurava fraudes em procedimentos licitatórios no HMAR, ocorridos entre 2009 e 2012. Nessa época, o então diretor do HMAR coordenava um esquema de recebimento de propina de 10% sobre compras efetuadas pelo hospital. No total, foram condenados dois coronéis do Exército, dois tenentes e três civis.